"Sobre o colchão pousado no chão, um lençol branco a cobrir-lhe o corpo nu, fumava lentamente, a cabeça de lado, repousando sobre a almofada.
As coisas não iam bem, as coisas não iam bem há muito tempo, e agora era pior ainda. Porque ele tinha-se esforçado para que fosse de outra maneira, tanto quanto lhe tinha parecido possível, mas, tarde ou cedo, acabara por desistir. Ficaria para a próxima.
Só que agora não haveria outra vez. Ele tinha tentado mas não conseguira, de nada valia continuar a mentir-se. Nem encontrar um qualquer sentido que unisse todo o tempo desperdiçado conseguia. Talvez bastasse, mas não conseguia.
Como é que de um momento para o outro deixara de haver tempo a mais para deixar de haver tempo? Perguntava e não respondia. Continuava a fumar.
Seria a mentira? Talvez. Talvez fosse a mentira que o tinha levado até ali. Ninguém nasce mentiroso, uma pessoa aprende a mentir. Desde novo sentira uma irresistível atracção por essa possibilidade reservada aos humanos. Nada de mais simples e difícil. Mentir é um jogo da imaginação e ele lembrava-se do orgulho que tinha em se esconder nesse labirinto, como quem sente o prazer de uma vitória sobre si próprio."
Pedro Paixão
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